Um navio ergueu suas velas contra o
vento de abril e desceu o rio Tâmisa, rumo ao canal da Mancha. Ele se dirigia à
Índia, levando William Carey, o ardoroso sapateiro que se tornara pregador, e seu
amigo missionário, o dr. John Thomas.
Os dois homens levantaram fundos,
empacotaram suas coisas e se despediram. Agora, o navio seguia pela costa da
Inglaterra antes de penetrar em mar aberto. Anos de sonhos, de orações e de
preparação pareciam perto de seu cumprimento na vida de Carey.
Porém, o mar encrespado e os perigos
da guerra da Inglaterra com a França colocaram fim às esperanças ambiciosas de
Carey: a viagem foi cancelada. Intrépido, Carey — que chamava a si mesmo de
"lutador", mas que era, na verdade, um incansável visionário —
marchou por entre um sem-número de oposições e passou por todos os tipos de
dificuldades para realizar seu trabalho.
Sua infância foi pobre. Seu pai era um tecelão que dava aulas para ajudar a sustentar os cinco
filhos. William era o mais velho e aprendeu a ler e escrever com entusiasmo,
devorava livros de aventura como Robinson Crusoe e As viagens de Gulliver. Sua
saúde nunca foi muito forte, mas ele conseguiu aprender o ofício de sapateiro.
Aos dezessete anos, freqüentava uma
igreja dissidente com um amigo, época em que assumiu um compromisso com Cristo.
Deixou a Igreja Anglicana onde fora criado, provocando a desaprovação de seu
pai, e tornou-se cada vez mais ativo junto aos dissidentes. Ele se casou e
começou a pregar nas igrejas. Durante algum tempo, caminhava doze quilômetros
todos os domingos para pregar em uma igreja pobre em uma cidade vizinha.
Mergulhou no estudo do Novo Testamento e da língua grega e, de alguma maneira,
conseguiu levar três carreiras em paralelo: sapateiro, professor e pastor.
Além da saúde debilitada, havia as
dificuldades em família. Um filho morrera ainda bebê. Sua esposa passou por
dificuldades, as quais se transformariam em uma seqüência de problemas mentais.
Raramente tinham dinheiro suficiente para alimentação adequada. A despeito de
tudo isso, Carey ficou cada vez mais obcecado pela obrigação de os cristãos
levarem o evangelho às multidões em outros países.
Nas reuniões de ministros de sua
área, Carey defendia a causa de que os cristãos deveriam espalhar o evangelho
para as terras distantes. Ele era constantemente contestado. "Se Deus quer
salvar os índios", diziam, "ele vai fazer isso mesmo que não tenha a
minha ajuda ou a sua". Chegou até mesmo a ponto de publicar um tratado
chamado Investigação sobre a obrigação
dos cristãos de empregar meios para a conversão dos pagãos, em que
defendia a idéia das missões estrangeiras. Foi um trabalho primoroso, mas que
não foi bem compreendido.
Três semanas depois de o tratado ter
sido publicado, a Associação dos Ministros convidou Carey para ministrar-lhes
uma palestra. Carey usou o texto de Isaías 54.2,3: 'Alargue o lugar de sua
tenda...". Seu tema era: "Espere grandes coisas de Deus; faça grandes
coisas para Deus". Porém, seus ministros permaneceram impassíveis.
Conforme a reunião se aproximava do final, Carey desabafou com grande
frustração: "Será que, mais uma vez, não farão nada?". Poique ele não
conseguia encontrar outras pessoas dispostas a compartilhar e levar adiante sua
visão?
Uma chama, no entanto, fora acesa.
Na reunião seguinte, foi formada uma sociedade missionária. O médico cristão
John Thomas dispôs-se a servir na índia, mas ele precisava de um associado. Carey
decidiu ir com ele.
A situação parecia absurda. Carey
tinha uma esposa grávida e três filhos pequenos. Será que ele conseguiria
vencer as pressões físicas de sua própria saúde debilitada? Aquilo, porém, era
a realização de seus sonhos. Carey se dispôs a seguir adiante, apesar de muitos
contratempos: após uma rápida incursão para levantar fundos, estes ainda eram
escassos; o dr. Thomas estava sendo procurado por credores que não haviam
recebido seu dinheiro; sua esposa recusou-se a viajar com ele; e, além disso
tudo, a repentina interrupção da viagem do navio. Esse atraso deu a ele mais
tempo para voltar para casa e convencer sua esposa, Dorothy, a acompanhá-lo.
Pouco tempo depois, estavam de
partida novamente, chegando a Calcutá em novembro de 1793. Porém, os problemas
continuaram: as condições eram horríveis; a saúde deles não estava boa; Thomas
continuou a acumular dívidas, e não havia conversões. Seu filho mais jovem
morreu, e os dois mais velhos eram muito indisciplinados.
Em 1800, a família Carey se mudou
para Serampore, juntando-se a um grupo de missionários dinamarqueses. Ai, eles
presenciaram a primeira conversão ao cristianismo, devido, em parte, aos
esforços do filho mais velho de Carey Félix, agora cristão. Em pouco tempo, uma
igreja foi formada, e uma tradução do Novo Testamento para a língua bengali foi
concluída.
Três décadas de sucesso missionário
estavam apenas começando. A época de sua morte, em 1834, Carey já havia
traduzido a Bíblia para 44 línguas ou dialetos e dera início a diversas escolas.
Várias frentes missionárias evangelizaram ativamente a India e os países
vizinhos, Birmânia e Butão. Porém, além dessas estatísticas, Carey desenvolveu
uma filosofia de missões passível de ser executada e a colocou em prática.
Ele estava muito à frente de seu
tempo. Tinha um imenso respeito pela cultura da índia e via a necessidade da
criação de uma igreja indiana autóctone. Em vez de utilizar muito tempo
condenando o hinduísmo, proclamava a morte e a ressurreição de Cristo.
Embora tenha realizado grandes feitos
individuais, Carey também foi uma pessoa que trabalhava de forma magistral em
equipe. Com base na sua experiência, ele aprendeu que a equipe de missões é
mais forte do que os indivíduos que fazem parte dela. Carey também enfatizou o
valor das mulheres como parte dessas equipes.
Às vezes, temos a idéia, equivocada,
de que Carey foi o único responsável por colocar a igreja na era das missões,
mas, na verdade, ele foi um dos muitos cristãos ocidentais chamados para apoiar
o trabalho de missões estrangeiras. Sua voz foi simplesmente uma das mais
claras, pois suas palavras foram fundamentadas com sua própria vida.
Nenhum comentário:
Postar um comentário