Eclesiastes 12:9-14
O pensador como ensinador
12:9 O Pregador, além de sábio, ainda
ensinou ao povo o conhecimento; e, atentando e esquadrinhando, compôs muitos
provérbios.
10 Procurou o
Pregador achar palavras agradáveis e escrever com retidão palavras de verdade.
Afastamo-nos um pouco para ver a
pessoa e o processo que se escondem por trás deste notável livro. As
observações iniciais apontam para a parceria entre as idéias e a expressão, a
busca e os ensinamentos, que o próprio livro ilustrou. Vimos como os capítulos de conselhos práticos equilibraram e
suplementaram as profundas reflexões por eles interrompidas. O que surge no restante destes dois
versículos é a grande
importância que o autor dá ao seu papel de ensinador. Ele não é o orgulhoso pensador que não
tem tempo para as mentes menos privilegiadas; antes, aceita o ideal desafiador da perfeita
lucidez. Como destaca
o versículo 10, é preciso ter a habilidade e a integridade, o encanto e a coragem de um artista
e de um mestre para fazer justiça à tarefa. Na força deste único versículo, este homem poderia
ser o santo patrono dos escritores.
Ensinamentos penetrantes
12:11 As palavras
dos sábios são como aguilhões, e como pregos bem fixados as sentenças
coligidas, dadas pelo único Pastor.
12 Demais,
filho meu, atenta: não há limite para fazer livros, e o muito estudar é enfado
da carne.
Eis aí mais duas qualidades que
caracterizam os oportunos ensinamentos do sábio: eles despertam a vontade e se fixam na
memória. Com isto, Coelet, mestre como é,
paga um tributo involuntário ao maior de
todos os mestres da sabedoria: nosso Senhor, cujas palavras apresentam estas duas marcas de maneira suprema, da
mesma forma como ultrapassam o critério do versículo 10, de "palavras
agradáveis" e "palavras
de verdade". Elas casam a justeza com a intrepidez, parceiras que
não devem ser separadas.
O que importa acima de tudo é que
são palavras de autoridade. Com toda a sua variedade e evidente humanidade, elas são dadas
aos sábios.
Constituem uma unidade, e provêm de Deus. Este segundo termo aplicado a Deus, o único
Pastor, é um complemento apropriado ao
majestoso título do versículo 1, "teu Criador". O Deus "distante", cuja ordem alcança a todos, também é o
Deus "próximo", que conhece e pode ser conhecido,
que nos fala com voz humana mas decisiva.
O curioso é que, como percebemos
no versículo 12, isto não nos agrada. Nós nos tornamos viciados na pesquisa propriamente
dita, apaixonados
pelas nossas perguntas mais difíceis. Uma resposta estragaria tudo. C. S. Lewis, em uma de
suas confrontações no livro The Great Divorce (O Grande Divórcio), capta o tom e a qualidade desta atitude,
à altura em que ela
finalmente se apossa do homem. Nessa cena, na fronteira do céu, um "pesquisador" vitalício
é convidado a entrar. Dizem-lhe:
"Não posso lhe prometer...
qualquer campo de ação para os seus talentos: apenas o perdão por havê-los pervertido. Nenhuma
atmosfera de pesquisa, pois vou introduzi-lo na terra onde não há perguntas, apenas respostas, e você verá a face de Deus."
"Ah! mas nós devemos
interpretar essas belas palavras à nossa própria maneira! Para mim não existe
resposta final. O vento livre da pesquisa deve continuar sempre soprando através de nossa
mente, não deve?"...
... "Ouça!", disse o
Espírito Branco. "Você já foi criança. Você aprendeu para que servia a
pesquisa. Houve um tempo em que você fazia perguntas porque queria respostas, e
ficava satisfeito quando as encontrava.
Torne-se essa criança novamente, agora mesmo."
"Ah! mas quando eu me tornei
um homem eu deixei de lado as coisas
infantis!
Nenhum argumento, nenhum apelo
valerá contra esta infinita elasticidade.
O encontro, já infrutífero, acaba com o gentil sofista lembrando-se de que tem um encontro; desculpa-se, então, e corre para
o seu grupo de debates no inferno.
O ponto de chegada
12:13 De tudo o que se tem ouvido, a
suma é: Teme a Deus e guarda os seus mandamentos; porque isto é o dever de todo
homem.
14 Porque Deus
há de trazer a juízo todas as obras, até as que estão escondidas, quer sejam boas,
quer sejam más.
Até agora, nenhum dos nossos
caminhos nos levou a parte alguma. Eles acabaram muito antes de alcançarmos qualquer coisa
eterna e absoluta.
Mas o caminho a que nos trouxe este capítulo aponta para Deus, o Eterno, para
quem "a eternidade no coração do homem" (cf. 3:11) foi criada para ali habitar e gravitar:
Se esta maneira de colocar as
coisas destaca mais a necessidade do homem do que a exigência de Deus, estes
dois versículos logo vão restabelecer o equilíbrio. Mas eles prazerosamente concedem ao
elemento humano o
seu devido direito, através das palavras porque isto é o todo do homem. É verdade que, entre outras
cousas, é o seu dever; mas o heb. não diz isso; deixa esse todo indefinido. "Isto",
como poderíamos traduzir, "é tudo o
que o homem tem"; mas é um "tudo" que fica em total contraste com a "vaidade" com que nos tem
confrontado o livro. Aqui
finalmente encontraremos realidade e nos encontraremos a nós mesmos.
Não, entretanto (e com isto o
equilíbrio é restaurado), como perfeccionistas que buscam para si o que é melhor, mas como
servos apresentando-se
ao seu legítimo senhor. Teme a Deus é uma convocação que nos coloca no nosso
devido lugar, e a todos os demais temores, esperanças e perplexidades nos seus devidos lugares.
O derradeiro versículo destaca o
ponto que acabamos de apresentar, com um golpe final que é bastante forte para
machucar, mas bastante
inteligente para nos fazer sair da apatia. Acaba com a complacência, avisando-nos de que nada
passa despercebido e sem avaliação, nem mesmo as coisas que nós escondemos de nós mesmos. Mas ao
mesmo tempo
transforma a vida. Se Deus se importa tanto assim, então nada pode ser sem sentido.
Esta é a verdade que já nos foi
apresentada em 11:9; e, além do mais, ela dá colorido a todos os ensinamentos
de Cristo, para quem nenhum detalhe aqui na terra poderia ser pequeno demais para ser importante no céu: uma palavra
fútil, a morte de um pássaro, um copo de água fria, o arrependimento de um
pecador. Foi isto também que incitou Paulo a ser insistente "a tempo e fora de
tempo" e a concluir a sua carreira
com alegria. Para qualquer outro senhor, ou para nenhum.
"As nações labutam -
apenas para o fogo, e os povos se fatigam - tudo para nada."
É uma coisa totalmente diferente
ficar sob as ordens de um senhor que se importa profundamente tanto com o trabalhador como com
o trabalho e cujo julgamento é infalível.
Não compete ao nosso autor
pesquisar mais sobre este julgamento, como e quando será realizado. Há um lugar para isso. Mas há
um lugar também, e
é aqui, para o silêncio que chama a atenção para o simples fato da aprovação ou da desaprovação de Deus.
Quando todos os detalhes tiverem sido
concluídos, este continuará sendo o ponto crucial. Em torno disto e nada mais gira a questão: se "tudo é
vosso" (como Paulo o colocou, especificando ainda: "o mundo
... a vida ... a morte ... as cousas
presentes ... as futuras") ou se, irremediavelmente, "tudo é vaidade".
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